Desenvolvido por Mitsubishi Pharma Corp e Novartis AG, o Fingolimode é um fármaco imunossupressor que foi sintetizado pela primeira vez em 1992 pela Yoshimoto Pharmaceuticals.
Esse medicamento é derivado de um produto natural imunossupressor, a miriocina (ISP-I) por meio de uma modificação química. A miriocina é um metabólito que pode ser obtida isolada a partir do caldo de cultura de um tipo de fungo entomopatogênico, a Isaria sinclairii, que estranhamente é um fungo que pode agir como parasita de insetos e mata ou incapacita gravemente os mesmos.
Curiosamente, a miriocina foi originalmente identificada a partir de uma medicina tradicional chinesa e foi sintetizado para fins farmacêuticos na Universidade de Kyoto.
Caixa de Fingolimode sob a marca Gilenya |
Em setembro de 2010, o Fingolimod se tornou o primeiro medicamento imunossupressor por via oral aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA, para reduzir recaídas e retardar a progressão da deficiência em pacientes com formas recorrentes de esclerose múltipla.
O Fingolimode desenvolvido pela Novartis foi aprovado para o tratamento da Esclerose Múltipla (EM) sob a marca Gilenya. Além disso, esse medicamento também é útil no tratamento da síndrome de Rett.
Comentário sobre a postagem
Apesar desse artigo não ter tanta relação com a engenharia química, mesmo que essa medicação em sua forma de capsula se trata de um sal de cloridrato (cloridrato de Fingolimode) que possui uma formula química razoavelmente simples, C19H33NO2.
Estrutura química do fingolimode |
Eu estou dando continuidade a essa série de artigos referentes a medicações que vários leitores tem me pedido bastante, após verem os meus artigos sobre o acetato de glatirâmer , interferon, ocrevus e natalizumabe.
O artigo abaixo vai fala do Fingolimode de uma maneira que vai fugir um pouco da área da química, lembrando aos meus queridos leitores membros da APEMBS e da ALSAPEM, que essa série de artigos está sendo um grande desafio para min.
No entanto, esse artigo vai ser de grande ajuda para a turma da área da saúde e para as pessoas que fazem o uso (ou vão fazer) desse medicamento, que apesar do nome um pouco diferente, não é nenhum monstro para os pacientes que estão sendo acompanhados por um bom neurologista. Espero que esse artigo ajude vocês, boa leitura :)
Mecanismo de Ação na Esclerose Múltipla
O Fingolimode tem boa biodisponibilidade oral, tempo de meia-vida de eliminação de 8 dias, forte ligação às proteínas e grande volume de distribuição. O Fingolimode é metabolizado no fígado principalmente pelo citocromo P450 e é eliminado principalmente pelos rins.
Após a ingestão e absorção, o fingolimode é fosforilado pela esfingosina quinase 2 para formar a porção ativa de fingolimode-fosfato (fingolimode-P). Fingolimod-P é um agonista de S1P1, S1P3, S1P4 e S1P5. Fingolimod-P exibe afinidade marcada para S1P1 e após a ligação induz fosforilação e internalização dos receptores S1P1 quando ativados pelo ligante natural S1P são então reciclados para a membrana celular. No entanto, quando expostos a receptores fingolimod-P são sinalizados para degradação.
A regulação negativa dos receptores S1P1 nos linfócitos causa uma desaceleração da saída dependente de S1P dos nódulos linfáticos. O Fingolimode não afeta diretamente a função das células T, mas diminui as células T circulantes ingênuas e de memória central, incluindo as células Th17, poupando as células T efetoras de memória, este é o mecanismo pelo qual o Fingolimode é bem eficaz no tratamento da esclerose múltipla.
No entanto, o Fingolimode também pode atuar por meio de efeitos agonísticos diretos nas células endoteliais e pela modulação de outros S1PRs.
S1P e sua interação com S1PRs regulam várias funções imunológicas, cardíacas, vasculares e do sistema nervoso central. Sendo que o total de cinco S1PRs foram identificados e estão distribuídos em diferentes sistemas do corpo.
S1P1, S1P2, S1P3 são expressos de forma ubíqua, enquanto S1P4 é expresso principalmente em células linfáticas, e S1P5 é distribuído no baço e no sistema nervoso central. Já o S1P1 é altamente expresso em células endoteliais vasculares e linfáticas e é o receptor S1P predominante de linfócitos.
S1PRs e seu ligante natural S1P interagem com uma família de receptores acoplados à proteína G. S1P pode ter ações extracelulares e intracelulares. A interação entre S1P e S1PRs regula o mecanismo inflamatório e autoimune em vários níveis, incluindo efeitos sobre citocinas, quimiocinas e regulação do tráfego de células imunológicas.
S1P1 medeia a saída de linfócitos por meio dos efeitos de um gradiente S1P entre os linfonodos e o plasma. A imunidade adaptativa depende da recirculação de células T do sangue para os nódulos linfáticos, onde uma baixa concentração de S1P regula para cima a expressão de S1P1, que serve como uma sugestão para a migração para um ambiente de alta S1P no seio cortical e as células T são então liberadas para os dutos linfáticos eferentes e sangue.
Como Fingolimode atua na síndrome de Rett
A síndrome de Rett é um distúrbio genético e de neurodesenvolvimento raro que afeta principalmente meninas. A maioria dos casos dessa síndrome é causada por mutações no gene MECP2, que fornece instruções para fazer uma proteína que está envolvida no funcionamento normal das células nervosas.
Mutações no MECP2 fazem com que essa proteína seja produzida incorretamente ou em pequenas quantidades. Isso causa uma série de problemas neurológicos, que contribuem para a síndrome de Rett.
Sendo um desses problemas o aumento da inflamação no cérebro, pois MECP2 normalmente suprime moléculas de sinalização inflamatória (Citocinas) , que atuam mantendo o sistema imunológico sob controle.
O Fingolimode é metabolizado em uma forma ativa que se liga e bloqueia receptores específicos chamados de receptores 1, 3, 4 e 5 da esfingosina 1-fosfato. Esses receptores são encontrados nas células que compõem a vasculatura e controlam como eles vão interagir uns com os outros.
As barreiras estreitas entre as células significa que o movimento das células imunes para fora dos gânglios linfáticos é impedido, enquanto as barreiras abertas significam que o movimento livre das células imunes dos gânglios linfáticos para a corrente sanguínea é permitido.
Na síndrome de Rett, o Fingolimode é usado para bloquear esses receptores e manter as interações entre as células estreitas, bloqueando a capacidade das células imunológicas de deixar os gânglios linfáticos e atingir a circulação e, possivelmente, o cérebro.
Além disso, alguns estudos demonstraram que o Fingolimode também pode melhorar a funcionamento do sistema nervoso. No entanto, esse mecanismo ainda é desconhecido, mas os resultados obtidos em estudos indicam que Fingolimode pode ter um efeito terapêutico direto no sistema nervoso e também no sistema imunológico.
Dosagem do Fingolimode
Esse medicamento pode ser indicado para o tratamento de pacientes adultos e pediátricos acima de 10 anos de idade com esclerose múltipla remitente recorrente para reduzir a frequência de reincidências e retardar a progressão da incapacidade.
A dose recomendada de Cloridrato de Fingolimode é geralmente de uma cápsula de 0,5 mg tomada por via oral uma vez ao dia, que pode ser tomada juntamente com alimentos ou não.
Efeitos Colaterais do medicamento
Os efeitos colaterais mais comuns desse medicamento são:
- Dor de cabeça,
- Sensação de cansaço,
- Gripe,
- Nariz entupido,
- Sinusite, diarreia,
- Dor nas costas,
- Elevações da transaminase hepática,
- Tosse.
Além disso, as mulheres durante o seu período de gravidez e amamentação não poderão usar esse medicamento, pois o mesmo pode causar danos ao feto e, também demora cerca de 2 meses para ser eliminado do corpo.
Ainda não se sabe ao certo se esse medicamento passa para o leite materno, logo não é bom arriscar usando o Fingolimode. Se o paciente apresentar qualquer um dos sintomas citados acima, o mesmo devera avisar o seu médico imediatamente, pois alguns pacientes não conseguem se adaptar bem com essa medicação.
Recomendação de outros artigos de medicamentos para Esclerose Múltipla
Esse artigo faz parte de uma série de artigos que eu fiz referente a medicações que são usadas para o tratamento de esclerose múltipla. Eu fiz essa série de artigos a pedidos dos leitores do blog que são portadores dessa doença, e que carecem de informações sobre a parte química e bioquímica desses medicamentos.
Além dos artigos recomendados que aparecem abaixo desse artigo, o blog também tem um artigo que tem uma lista que linka para outros artigos referentes a medicações para esclerose multiplica.
Se você for um paciente que está passando por tratamento, ou algum curioso que é interessado no assunto. Eu espero que o link acima desta lista de medicamentos te ajude bastante, pois eu já falei de boa parte dos medicamentos aqui no blog, e também sei bem que o tratamento dessa doença não é nada fácil.
Referências
- https://ademmadrid.es/2019/07/30/alerta-sanitaria-sobre-fingolimod-gilenya/ (acessado em 05/11/2020 as 20:23)
- Multiple Sclerosis: A Guide to Pharmacologic Treatment, Daniel Ontaneda, SEEd, 2013.
- https://rettsyndromenews.com/fingolimod/ (acessado em 05/11/2020 as 23:58)
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2754916/ (acessado em 06/11/2020 as 00:06)
- https://www.novartis.us/sites/www.novartis.us/files/gilenya.pdf (acessado em 06/11/2020 as 00:14)
- https://www.researchgate.net/publication/7961767_Fingolimod_Mitsubishi_PharmaNovartis (acessado em 06/11/2020 as 19:42)
- https://www.rxlist.com/gilenya-side-effects-drug-center.htm (acessado em 09/11/2020 as 11:42)
- https://portal.novartis.com.br/UPLOAD/ImgConteudos/1823.pdf (acessado em 09/11/2020 as 11:53)
Sobre o autor
Olá meu nome é Pedro Coelho, eu sou engenheiro químico, engenheiro de segurança do trabalho e Green Belt em Lean Six Sigma. Além disso, também sou estudante de Engenharia Civil, e em parte de minhas horas vagas me dedico a escrever artigos aqui no ENGQUIMICASANTOSSP, para ajudar estudantes de Engenharia Química e de áreas correlatas. Se você está curtindo essa postagem, siga-nos através de nossas paginas nas redes sociais e compartilhe com seus amigos para eles curtirem também :)
4 Comentários de "Fingolimode – Medicação para Esclerose Múltipla e Síndrome de Rett"
Muito obgg Pedro👏👏
Gostei muito.Parabéns pela dedicação.
Ñ sabia q poderia ser usado na Sd Rett.No entanto acima de 10 anos, e tenho uma conhecida com filha c 2 anos.
você sabe qual é o preço do fingolimode?
Olá anônimo
O preço do fingolimode pode variar bastante dependendo da farmácia e da localização. Por exemplo, uma caixa de Cloridrato de Fingolimode com 28 cápsulas de 0,5 mg, pode ser encontrada por valores que vão desde aproximadamente R$ 5.225,03 até R$ 7.990,00.
Ainda bem que o SUS fornece essa medicação de alto custo para os portadores de EM, pois muita gente não teria condição de compra esse remédio para fazer o tratamento.
Espero ter ajudado
Um abraço
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